Quase sem os rins, mas ainda vivos...
Imaginem os Três Patetas em
Nova York, em setembro de 2013, filmando uma comédia pastelão?
Levando-se em consideração que o Moe, o Larry e o Curly-Joe exerceram suas atividades somente até 1970, realizem a cena.
Foi pior do que se pode imaginar.
Pois bem. Vou tentar narrar o filme.
Moe já conhecia Nova York.
Curly-Joe não, nunca tinha estado lá. Inclusive, vale citar que Curly estava muito ansioso para conhecer a cidade que nunca dorme.
Larry, por sua vez, já havia estado lá algumas vezes e era o único a falar a língua nativa com certa fluência.
Ele até se achava capaz de tomar decisões sobre o tipo de transporte que os três deveriam usar do JFK até o hotel em Manhattan, vejam só.
“Pessoal, quando chegarmos ao JFK, a melhor coisa é pegarmos um car service pick-up no aeroporto.
Nada de pegarmos aqueles yellow cabs fim de carreira, tá bom?
Sei que é legal, turístico, aparentemente super cool, mas, no geral, a porra dos bancos estão sempre engordurados. Toda vez que eu pego um destes, tenho certeza de que alguém acabou de comer um big mac, batatas fritas, um balde cheio de frango do KFC, não limpou as mãos e ficou esfregando os dedos, de sacanagem, no banco do passageiro.
E aí, entro eu, a corna.
Se é que não fizeram algo pior no taxi antes da minha entrada.
E o filho da puta do taxista, no geral um indiano, faz curvas fechadas (mais parecendo um argentino) e eu fico de um lado para o outro, escorregando naquela gordureira.
Acreditem, por mais glamour que pareça, estar no yellow cab não compensa.
Vamos pegar o taxi preto.
Fechado?”
“Você é quem manda, Larry!!!”
E lá fomos nós, em nosso Boing 777 rumo aos Estados Unidos da America.
Viagem ótima.
Avião espaçoso.
Não tinha ninguém ao meu lado.
Tomei meu companheiro Stilnox e fui para o saco.
A Sol e Tahan, quer dizer, o Moe e o Curly-Joe também dormiram.
Colocaram suas máscaras para repouso e adiós.
Pela manhã, ninguém nos acordou com um toquinho nos ombros, pois estávamos na classe econômica.
Sentimos que estávamos chegando em New York e despertamos.
“Acho que estamos chegando, amigos.” New York is ours!!!”
Pegamos aquela mega fila na imigração.
Aquele bando de gente estranha na fila.
De praxe.
Conseguimos passar os três pela imigração, sem muitos constrangimentos.
Pegamos as as malas e seguimos a procura do black cab.
“Sol e Rê, vamos tentar achar o preto mesmo, pois é melhor do que o amarelo. Ele deve ficar naquela fila lá do outro lado da rua.
Não é a limousine não.
Ele é um carro preto normal, ok?”
“Beleza, Lô!”
E vimos um montão de taxis amarelos e nenhum preto.
O aeroporto parecia um formigueiro de tão cheio.
Não podíamos nos perder de jeito nenhum.
O foco era total um no outro.
De repente, um sujeito veio até nós e nos perguntou: “looking for cabs?”
Eu respondi: “black cab, yes.”
Ele disse: “yes, come with me.”
Eu disse: “É ele, gente, vamos.”
E lá fomos nós, atrás do tão sonhado taxi preto.
O Renato foi atrás dele, a Sol e eu atrás do Renato.
Andamos rápido, puxando nossas três malinhas.
Estávamos nos divertindo um monte, para variar.
Depois de uma bela andada, sem prestar muita atenção no estranho caminho que estávamos fazendo, reparei que tínhamos acabado de entrar em uma roubada.
Eu estava super distraída com a Sol, rindo, conversando, enquanto o Renato já estava colocando as malas em uma van marrom metálica, 1980, toda batida.
Caraca, aquilo ali não era um black cab nem ali e nem na China.
Tínhamos entrado na conversa daquele cara.
Aliás, eu tinha entrado na conversa dele e tinha levado a Sol e o Renato para o buraco comigo.
Como podia ter feito uma coisa daquelas com a gente?
Fui muito mirim.
Eu não conseguia acreditar na cena que estava vendo...o Renato ajudando o cara a colocar as malas dentro daquele carro podre.
E não dava nem para a gente recuar.
Estávamos perdidos.
O Renato entrou primeiro no carro.
Foi lá pra trás.
Depois foi a nossa vez. A Sol e eu entramos e sentamos uma ao lado da outra, atrás do motorista. Nós três estávamos apáticos, meio catatônicos até.
O motorista começou a dar ré no caro.
Ele também começou a interagir com a gente.
“Where are you heading to?” Ninguém disse nada.
Eu percebi que teria que começar a falar.
“We are going to a hotel in Manhatan.
Do you need the address already?” “Yes, please.”
“Sol, me dá aí o endereço do hotel.”
A Sol pegou o endereço na mochila e me deu.
A Sol só ria. Eu, de verdade, não sabia se ela estava entendendo a gravidade da situação.
Talvez estivesse entendendo e estivesse disfarçando.
O Renato, por sua vez, estava calado, parado, imóvel, não esboçava nenhum sentimento, indiferente.
“Sir, here is our hotel address.”
“Where are you from?” “We are from Brazil. And you?
“I am from New York, Bronx.” Caraca, pensei, a Rocinha de Nova York.
Se bem que agora ele virou um bairro cultural, coisa e tal.
Ai meu Deus. Tanta coisa passou pela minha cabeça.
Virei para o Renato e perguntei para ele se tínhamos fechado o preço para que ele nos levasse até o hotel.
O Renato falou que não. A Sol também achava que não. Caceta.
Ferrou outra vez. Extorsão.
“Sir, we know you have told us beforehand, but can you repeat the value you will charge us for this ride to Manhatan?”
“You don’t know?” “We know, but we don’t remember.”
“It’s US$ 190,00 + toll + the bags.” “Ok, Sir.”
“Caraca, Sol e Rê, estamos sendo roubados descaradamente.
Eu acho que o taxi para Manhatam, do JFK, não custa mais do que US$ 65,00.”
“Are you ok back there?”
“Yes, we are.”
“Is he a soccer player?
A soccer player and his two women?”
“Gente, ele está nos perguntado se o Renato é um jogador de futebol e nós somos suas duas mulheres. Acreitam?
A reação da Sol e do Renato continuava a mesma...a Sol só ria e o Renato continuava catatônico.
E eu continuava nervosa, sem saber para onde o fulano estava nos levando.
Eu não reconhecia o caminho, não conseguia ver um lugar conhecido, nada.
Estava com muito medo.
Não conseguia parar de pensar na merda que tinha feito com nós três.
Que medo, quanto medo.
Eu também não acreditada na pergunta que ele tinha acabado de fazer.
Parecia, mais ainda, que as intenções eram as piores possíveis.
Que pergunta tinha sido aquela?
“No, Sir, he is not a soccer player.
We are just friends coming together to New York for tourism.“
“And they don’t talk much, your friends, right?”
“No, they do talk. They are all right.
Are we close to Manhatan already, Sir?”
“No, not yet.” “Sol e Rê, ele disse que nós ainda estamos longe.
Eu não estou reconhecendo este caminho.
Estou com medo. E vocês?
O Renato, mordendo sua língua, tipicamente numa demonstração de nervosismo, continuava sem dizer nada.
A Sol não parava de falar coisa com coisa.
Porém, tínhamos que focalizar, tínhamos que, juntos, pensar em algo a fazer, algum plano B.
E se ele estivesse nos levando para algum lugar ermo?
E se neste lugar houvesse outras pessoas nos esperando para nos assaltar?
E se o assalto fosse o de menos, e se eles fossem roubar os nossos órgãos?
E se fossem nos estuprar?
Sei lá, tantas coisas horríveis poderiam estar para acontecer.
Tínhamos que focalizar, organizar nossos pensamentos e tentar pensar em algo.
Veio-me uma idéia à cabeça.
Contatei o Luiz, meu marido pelo celular.
Enviei um What’s up pra ele, explicando a situação.
Disse a ele para que tentasse nos localizar de alguma maneira.
Ele não entendeu nada no começo, mas depois viu que era sério.
Porém, com seu estômago de avestruz, seu jeito monge de ser, levou numa boa, como se tivéssemos tomando picolé num buffet infantil.
Nós três, lá dentro do carro do negão, achando que estávamos sendo sequestrados, e ele respondendo que aquela situação estava fora do controle dele.
Zero de mobilização, de preocupação.
Impressionante.
Ele sempre acha que tudo vai dar certo, que tudo está sob controle, aliás, que está fora do controle dele, que a situação sempre foi causada pela pessoa por uma razão errada, que o erro foi da pessoa e que, portanto, o acidente poderia ter sido evitado, então, que de repente, a pessoa tem que passar pela situação mesmo, como forma de pagamento pelo erro, já que fez merda.
Mas enfim, pós desabafo, ficamos nos comunicando via What’s up.
Ele não conseguiu nos localizar.
Mas eu queria pedir para que ele chamasse o Emergency 911.
Eu também pedi para ele ver quanto custava um taxi do JFK para Manhatan.
Se lá, eu pedi um milhão de coisas para o Luiz.
Pedi até para ver se havia notícias de sequestro de pessoas para retirada e venda de órgãos em NY.
Enquanto isso, a Sol e eu continuávamos as nossas conversas, rindo, brincando, procurando relaxar.
Tentávamos tirar o Renato da sua inércia.
A quietude dele nos deixava ainda mais nervosas.
Não sabíamos o que ele estava pensando.
Isto era terrível.
Sabe Deus se ele tentaria alguma manobra.
Tínhamos que estar preparadas.
De repente, eu avisto o World’s Fair Tower do lado direito da estrada.
Não acreditei.
Finalmente, reconheci algo.
Estávamos indo para Manhatan.
Tínhamos passado em tantos lugares estranhos desde o aeroporto, tantas vizinhanças malucas, tantos lugares feios e, do nada, avistei um lugar conhecido.
Chorei quieta.
Vi uma luz no fim do túnel.
“Rê e Sol, eu conheço esse lugar.
Acho que estamos indo para o hotel. Graças a Deus.”
“Sério, Lô?” “Sério.”
Todos ficamos mais aliviados.
Não era garantia de nada, mas parecia um lugar mais conhecido, parecia que estávamos indo para a ilha.
E mais adiante tinha o pedágio.
Não teria porque ele ir em direção ao pedágio se não fossemos para a ilha.
Eu estava começando a ficar menos tesa.
“Sol, você até parou de falar um pouco.
O que houve?”
Ao contrário da Sol, o Renato passou a falar um pouco mais.
E os caminhos foram ficando mais conhecidos.
E o dia foi ficando mais claro, as nuvens escuras foram indo embora.
Eu já fui me imaginado com os meus rins no lugar, com o meu fígado no lugar.
Fui pensando que continuaria a ter os meus amigos ao meu lado.
Fui conseguindo raciocinar novamente, pensar na cagada que havia feito, mesmo com tanta experiência em viagens, pensar que poderia estar sendo estuprada, juntamente com a Sol, na frente do Renato, naquele momento, pensar num turbilhão de coisas imundas.
E se tivesse viajando só com a Laís? E se tivéssemos só em meninas? Foi um grande aprendizado.
Embora já saibamos de tudo isso, sejamos, teoricamente, pessoas esclarecidas, nós nos deixamos levar pelas emoções, pelos momentos, e acabamos fazendo besteiras como esta, desta viagem, que poderia ter sido a última de nossas vidas.
No final das contas, o Sir nos deixou em nosso hotel em Manhatan e foi-se embora.
Ainda nos perguntou se queríamos que nos pegasse para nos levar de volta ao JFK no dia da partida.
Dissemos que não, pois uma coisa foi fato...fomos assaltados por ele na ida, extorquidos.
Não fomos sequestrados, mas roubados, descaradamente roubados.
Queridos amigos Sol e Renato, acho que nunca pedi perdão, formalmente, a vocês.
Desculpem-me por ter feito vocês passarem pelo que passaram.
Dependeu mais de mim, com toda certeza.
Desculpem-me de verdade. Vocês não têm ideia da aflição que senti.
Agora, rimos juntos. Mas choramos juntos também.
Que bom que podemos rir de mais esta.
Perdão.
Ainda bem que estamos vivos, com nossos órgãos nos lugares, podendo contar esta história macabra a todos.
Espero que ainda me convidem para viajar com vocês.
Prometo que nunca mais decido o tipo de transporte que pegaremos do aeroporto para o hotel, tá bom?
Deus nos livre.
Levando-se em consideração que o Moe, o Larry e o Curly-Joe exerceram suas atividades somente até 1970, realizem a cena.
Foi pior do que se pode imaginar.
Pois bem. Vou tentar narrar o filme.
Moe já conhecia Nova York.
Curly-Joe não, nunca tinha estado lá. Inclusive, vale citar que Curly estava muito ansioso para conhecer a cidade que nunca dorme.
Larry, por sua vez, já havia estado lá algumas vezes e era o único a falar a língua nativa com certa fluência.
Ele até se achava capaz de tomar decisões sobre o tipo de transporte que os três deveriam usar do JFK até o hotel em Manhattan, vejam só.
“Pessoal, quando chegarmos ao JFK, a melhor coisa é pegarmos um car service pick-up no aeroporto.
Nada de pegarmos aqueles yellow cabs fim de carreira, tá bom?
Sei que é legal, turístico, aparentemente super cool, mas, no geral, a porra dos bancos estão sempre engordurados. Toda vez que eu pego um destes, tenho certeza de que alguém acabou de comer um big mac, batatas fritas, um balde cheio de frango do KFC, não limpou as mãos e ficou esfregando os dedos, de sacanagem, no banco do passageiro.
E aí, entro eu, a corna.
Se é que não fizeram algo pior no taxi antes da minha entrada.
E o filho da puta do taxista, no geral um indiano, faz curvas fechadas (mais parecendo um argentino) e eu fico de um lado para o outro, escorregando naquela gordureira.
Acreditem, por mais glamour que pareça, estar no yellow cab não compensa.
Vamos pegar o taxi preto.
Fechado?”
“Você é quem manda, Larry!!!”
E lá fomos nós, em nosso Boing 777 rumo aos Estados Unidos da America.
Viagem ótima.
Avião espaçoso.
Não tinha ninguém ao meu lado.
Tomei meu companheiro Stilnox e fui para o saco.
A Sol e Tahan, quer dizer, o Moe e o Curly-Joe também dormiram.
Colocaram suas máscaras para repouso e adiós.
Pela manhã, ninguém nos acordou com um toquinho nos ombros, pois estávamos na classe econômica.
Sentimos que estávamos chegando em New York e despertamos.
“Acho que estamos chegando, amigos.” New York is ours!!!”
Pegamos aquela mega fila na imigração.
Aquele bando de gente estranha na fila.
De praxe.
Conseguimos passar os três pela imigração, sem muitos constrangimentos.
Pegamos as as malas e seguimos a procura do black cab.
“Sol e Rê, vamos tentar achar o preto mesmo, pois é melhor do que o amarelo. Ele deve ficar naquela fila lá do outro lado da rua.
Não é a limousine não.
Ele é um carro preto normal, ok?”
“Beleza, Lô!”
E vimos um montão de taxis amarelos e nenhum preto.
O aeroporto parecia um formigueiro de tão cheio.
Não podíamos nos perder de jeito nenhum.
O foco era total um no outro.
De repente, um sujeito veio até nós e nos perguntou: “looking for cabs?”
Eu respondi: “black cab, yes.”
Ele disse: “yes, come with me.”
Eu disse: “É ele, gente, vamos.”
E lá fomos nós, atrás do tão sonhado taxi preto.
O Renato foi atrás dele, a Sol e eu atrás do Renato.
Andamos rápido, puxando nossas três malinhas.
Estávamos nos divertindo um monte, para variar.
Depois de uma bela andada, sem prestar muita atenção no estranho caminho que estávamos fazendo, reparei que tínhamos acabado de entrar em uma roubada.
Eu estava super distraída com a Sol, rindo, conversando, enquanto o Renato já estava colocando as malas em uma van marrom metálica, 1980, toda batida.
Caraca, aquilo ali não era um black cab nem ali e nem na China.
Tínhamos entrado na conversa daquele cara.
Aliás, eu tinha entrado na conversa dele e tinha levado a Sol e o Renato para o buraco comigo.
Como podia ter feito uma coisa daquelas com a gente?
Fui muito mirim.
Eu não conseguia acreditar na cena que estava vendo...o Renato ajudando o cara a colocar as malas dentro daquele carro podre.
E não dava nem para a gente recuar.
Estávamos perdidos.
O Renato entrou primeiro no carro.
Foi lá pra trás.
Depois foi a nossa vez. A Sol e eu entramos e sentamos uma ao lado da outra, atrás do motorista. Nós três estávamos apáticos, meio catatônicos até.
O motorista começou a dar ré no caro.
Ele também começou a interagir com a gente.
“Where are you heading to?” Ninguém disse nada.
Eu percebi que teria que começar a falar.
“We are going to a hotel in Manhatan.
Do you need the address already?” “Yes, please.”
“Sol, me dá aí o endereço do hotel.”
A Sol pegou o endereço na mochila e me deu.
A Sol só ria. Eu, de verdade, não sabia se ela estava entendendo a gravidade da situação.
Talvez estivesse entendendo e estivesse disfarçando.
O Renato, por sua vez, estava calado, parado, imóvel, não esboçava nenhum sentimento, indiferente.
“Sir, here is our hotel address.”
“Where are you from?” “We are from Brazil. And you?
“I am from New York, Bronx.” Caraca, pensei, a Rocinha de Nova York.
Se bem que agora ele virou um bairro cultural, coisa e tal.
Ai meu Deus. Tanta coisa passou pela minha cabeça.
Virei para o Renato e perguntei para ele se tínhamos fechado o preço para que ele nos levasse até o hotel.
O Renato falou que não. A Sol também achava que não. Caceta.
Ferrou outra vez. Extorsão.
“Sir, we know you have told us beforehand, but can you repeat the value you will charge us for this ride to Manhatan?”
“You don’t know?” “We know, but we don’t remember.”
“It’s US$ 190,00 + toll + the bags.” “Ok, Sir.”
“Caraca, Sol e Rê, estamos sendo roubados descaradamente.
Eu acho que o taxi para Manhatam, do JFK, não custa mais do que US$ 65,00.”
“Are you ok back there?”
“Yes, we are.”
“Is he a soccer player?
A soccer player and his two women?”
“Gente, ele está nos perguntado se o Renato é um jogador de futebol e nós somos suas duas mulheres. Acreitam?
A reação da Sol e do Renato continuava a mesma...a Sol só ria e o Renato continuava catatônico.
E eu continuava nervosa, sem saber para onde o fulano estava nos levando.
Eu não reconhecia o caminho, não conseguia ver um lugar conhecido, nada.
Estava com muito medo.
Não conseguia parar de pensar na merda que tinha feito com nós três.
Que medo, quanto medo.
Eu também não acreditada na pergunta que ele tinha acabado de fazer.
Parecia, mais ainda, que as intenções eram as piores possíveis.
Que pergunta tinha sido aquela?
“No, Sir, he is not a soccer player.
We are just friends coming together to New York for tourism.“
“And they don’t talk much, your friends, right?”
“No, they do talk. They are all right.
Are we close to Manhatan already, Sir?”
“No, not yet.” “Sol e Rê, ele disse que nós ainda estamos longe.
Eu não estou reconhecendo este caminho.
Estou com medo. E vocês?
O Renato, mordendo sua língua, tipicamente numa demonstração de nervosismo, continuava sem dizer nada.
A Sol não parava de falar coisa com coisa.
Porém, tínhamos que focalizar, tínhamos que, juntos, pensar em algo a fazer, algum plano B.
E se ele estivesse nos levando para algum lugar ermo?
E se neste lugar houvesse outras pessoas nos esperando para nos assaltar?
E se o assalto fosse o de menos, e se eles fossem roubar os nossos órgãos?
E se fossem nos estuprar?
Sei lá, tantas coisas horríveis poderiam estar para acontecer.
Tínhamos que focalizar, organizar nossos pensamentos e tentar pensar em algo.
Veio-me uma idéia à cabeça.
Contatei o Luiz, meu marido pelo celular.
Enviei um What’s up pra ele, explicando a situação.
Disse a ele para que tentasse nos localizar de alguma maneira.
Ele não entendeu nada no começo, mas depois viu que era sério.
Porém, com seu estômago de avestruz, seu jeito monge de ser, levou numa boa, como se tivéssemos tomando picolé num buffet infantil.
Nós três, lá dentro do carro do negão, achando que estávamos sendo sequestrados, e ele respondendo que aquela situação estava fora do controle dele.
Zero de mobilização, de preocupação.
Impressionante.
Ele sempre acha que tudo vai dar certo, que tudo está sob controle, aliás, que está fora do controle dele, que a situação sempre foi causada pela pessoa por uma razão errada, que o erro foi da pessoa e que, portanto, o acidente poderia ter sido evitado, então, que de repente, a pessoa tem que passar pela situação mesmo, como forma de pagamento pelo erro, já que fez merda.
Mas enfim, pós desabafo, ficamos nos comunicando via What’s up.
Ele não conseguiu nos localizar.
Mas eu queria pedir para que ele chamasse o Emergency 911.
Eu também pedi para ele ver quanto custava um taxi do JFK para Manhatan.
Se lá, eu pedi um milhão de coisas para o Luiz.
Pedi até para ver se havia notícias de sequestro de pessoas para retirada e venda de órgãos em NY.
Enquanto isso, a Sol e eu continuávamos as nossas conversas, rindo, brincando, procurando relaxar.
Tentávamos tirar o Renato da sua inércia.
A quietude dele nos deixava ainda mais nervosas.
Não sabíamos o que ele estava pensando.
Isto era terrível.
Sabe Deus se ele tentaria alguma manobra.
Tínhamos que estar preparadas.
De repente, eu avisto o World’s Fair Tower do lado direito da estrada.
Não acreditei.
Finalmente, reconheci algo.
Estávamos indo para Manhatan.
Tínhamos passado em tantos lugares estranhos desde o aeroporto, tantas vizinhanças malucas, tantos lugares feios e, do nada, avistei um lugar conhecido.
Chorei quieta.
Vi uma luz no fim do túnel.
“Rê e Sol, eu conheço esse lugar.
Acho que estamos indo para o hotel. Graças a Deus.”
“Sério, Lô?” “Sério.”
Todos ficamos mais aliviados.
Não era garantia de nada, mas parecia um lugar mais conhecido, parecia que estávamos indo para a ilha.
E mais adiante tinha o pedágio.
Não teria porque ele ir em direção ao pedágio se não fossemos para a ilha.
Eu estava começando a ficar menos tesa.
“Sol, você até parou de falar um pouco.
O que houve?”
Ao contrário da Sol, o Renato passou a falar um pouco mais.
E os caminhos foram ficando mais conhecidos.
E o dia foi ficando mais claro, as nuvens escuras foram indo embora.
Eu já fui me imaginado com os meus rins no lugar, com o meu fígado no lugar.
Fui pensando que continuaria a ter os meus amigos ao meu lado.
Fui conseguindo raciocinar novamente, pensar na cagada que havia feito, mesmo com tanta experiência em viagens, pensar que poderia estar sendo estuprada, juntamente com a Sol, na frente do Renato, naquele momento, pensar num turbilhão de coisas imundas.
E se tivesse viajando só com a Laís? E se tivéssemos só em meninas? Foi um grande aprendizado.
Embora já saibamos de tudo isso, sejamos, teoricamente, pessoas esclarecidas, nós nos deixamos levar pelas emoções, pelos momentos, e acabamos fazendo besteiras como esta, desta viagem, que poderia ter sido a última de nossas vidas.
No final das contas, o Sir nos deixou em nosso hotel em Manhatan e foi-se embora.
Ainda nos perguntou se queríamos que nos pegasse para nos levar de volta ao JFK no dia da partida.
Dissemos que não, pois uma coisa foi fato...fomos assaltados por ele na ida, extorquidos.
Não fomos sequestrados, mas roubados, descaradamente roubados.
Queridos amigos Sol e Renato, acho que nunca pedi perdão, formalmente, a vocês.
Desculpem-me por ter feito vocês passarem pelo que passaram.
Dependeu mais de mim, com toda certeza.
Desculpem-me de verdade. Vocês não têm ideia da aflição que senti.
Agora, rimos juntos. Mas choramos juntos também.
Que bom que podemos rir de mais esta.
Perdão.
Ainda bem que estamos vivos, com nossos órgãos nos lugares, podendo contar esta história macabra a todos.
Espero que ainda me convidem para viajar com vocês.
Prometo que nunca mais decido o tipo de transporte que pegaremos do aeroporto para o hotel, tá bom?
Deus nos livre.
Caraca!!!! Essa historia dá até filme, de suspense é claro!!! Mas que bom que terminou tudo bem!!!
ResponderExcluir