Macau e José Saramago...que relação é essa?

Eu nunca fui lá para conferir, mas há quem diga que existem placas escritas em português e habitantes, mais velhos, sabendo falar o nosso idioma em Macau. Macau, para quem não sabe, foi colonizada e administrada por Portugal durante mais de 400 anos. Foi a última colônia europeia na China. São apenas 550 mil habitantes. Além dos cassinos, eles têm como atração no local o contraste português/chinês, a gastronomia rica e bem diferente da chinesa (não servem cachorros por lá, segundo soube), os projetos milionários, como em Dubai, incluindo áreas de entretenimento, torres enormes, pontes com bela arquitetura, hotéis deslumbrantes, entre outras diferentes propriedades. Acho que nunca contei isso, pelo menos não tão abertamente, mas tenho lá minha origem chinesa. O meu bisavó, que foi casado com a mãe do meu avó, por parte de mãe, era de lá, de Macau. Ele era super chinês. Chinês de olhos verdes. Dizem as más línguas, como a da minha avó, mãe da minha mãe, que o velho era feio, mas muito feito, mais do que feio. Mesmo assim, conseguiu galantear e, posteriormente, casar-se com uma portuga, a minha bisa. Pois bem...tudo isso para contar de onde vim, mas não, necessariamente, para onde vou. O fato é que tenho sangue tuga correndo em minhas veias...não dá para negar essa realidade. E não dá para dizer que seja um sangue de anemia, um sangue com ausência de ferro, um sangue mais fino...que nada...o meu sangue português é viscoso, gomoso. A minha mãe nasceu, nasceu, nasceu em Portugal...em Alcanena. Além disso, ela é neta de uma portuguesa com um chinês de Macau. E eu sou a bisneta de tudo isso. Como negar que essa miscigenação tenha acontecido? Não tem como. Sou chineguesa!!! O meu lado mais BRIC até existe. Destaco-me no cenário mundial, mas ainda estou em desenvolvimento. Tenho que aceitar isso. A questão é que quando se tem o sangue português correndo nas veias, não tem jeito, um dia, de uma forma ou de outra, essa força vem à tona, manifesta-se. Eu mesma confesso....tenho meus espasmos portugueses vez ou outra. Para minha sorte, os espasmos chineses se manifestaram em mim logo na infância. O povo chinês é laborioso, inteligente, hospitaleiro e cortês. Meus pais logo perceberam, desde a minha meninice, que eu tinha puxado mais para o lado chinês do que para o lado português da família...acho que em função da minha perspicácia. Brincadeiras a parte...o que escrevi acima é a mais pura verdade. Sou china com tuga...e esses nossos segredos de nacionalidade vem à tona um dia, não tem jeito. Certa vez, numa situação muito importante da minha vida, tive a certeza de que o meu lado português se sobrepôs ao chinês. Em 1993, prestei vestibular em três faculdades de São Paulo. Prestei Comércio Exterior, no Mackenzie e na Ibero Americana, e Relações Públicas, na Cásper Líbero. Queria mesmo é fazer Jornalismo ou Relações Públicas, mas acabei por também tentar o Comércio Exterior, curso que acabei cursando no Mackenzie. Por que será que não prestei Jornalismo em nenhum lugar? Sei lá, não me lembro. Eu passei no vestibular do Mackenzie e da Ibero, mas fui desclassificada na prova da Cásper. DESCLASSIFICADA!!! Quando vi o resultado, algum tempo depois da realização da prova, embora já soubesse que não tinha passado, que estava fora, eu, mesmo assim, sofri, sofri tudo de novo, tudo que já tinha sofrido no dia fatídico. O que houve? Fui, feliz da vida, toda animada, fazer a prova da Cásper Líbero. As provas do Mackenzie e da Ibero vieram depois. Bom, segui todo o ritual, direitinho...cheguei mais cedo ao local do vestibular, fui ao banheiro antes da prova, levei água, chocolate, lápis, borracha, caneta, enfim...até antes da aplicação do teste, mais precisamente até a parte em que tive que escrever a redação, fiz tudo de forma chinesa, lúcida. Enquanto estava fazendo a prova, respondendo as questões, senti que estava indo bem, muito bem por sinal. Tinha estudado muito, como todo bom CDF. Deixei a redação para o final. Já tinha dado uma olhada no tema, pois já queria ir trabalhando o texto, em minha mente, enquanto resolvia as outras questões. E fui que fui, bem pra caramba. Já estava pilhada e fui ficando ainda mais quando me dei conta de que aquele curso estava no papo. Nem precisaria mais me preocupar com o Mackenzie e com a Ibero, pois, na verdade, na verdade, eu queria mesmo era fazer aquele curso. Chegou a hora da redação. Como vocês já devem ter percebido, tenho problema zero com a escrita e com a quantidade dela. Adoro escrever, contar história, dedicar-me a essas minhas crônicas malucas. Gosto mesmo. A redação, com certeza, não seria o problema. Eu já tinha ido bem na prova...o jogo tava ganho. Parti para a redação. Lembro-me bem do enunciado, que era extremamente longo. Ele exigia atenção dos candidatos. Eu, como estava ansiosa, pois queria terminar logo tudo aquilo, fiz uma leitura dinâmica do tema e das instruções e parti para a escrita. Escrevi, escrevi, escrevi e mais escrevi. Nossa, pensei, a minha redação tinha ficado boa...tinha começo, meio e fim...a conclusão estava ótima. Senti-me bem, super bem. Missão dada, missão cumprida. Faltavam uns vinte minutos para a entrega da prova ao fiscal quando comecei a fazer a sua revisão. Revi tudo, reavaliei algumas questões, que tinham ficado meio pendentes, mudei umas coisinhas aqui e outras lá. Até ali, tudo tranqüilo. Não teria para ninguém. Eu tinha ido bem, certeza. Chegou a hora de rever a redação, última parte da prova. Nesse momento, faltavam apenas cinco minutos para o recolhimento do teste. Resolvi, por desencargo de consciência, ler, mas ler mesmo, o enunciado. Ninguém lê direito no Brasil. Por que eu teria que fazer parte dessa estatística, certo? E fui lendo, bem calminha, toda satisfeita. De repente...o pior...surtei. O lápis até caiu da minha mão. Não acreditei no que tinha acabado de ler, no que tinha constatado que tinha feito. Simplesmente, dei-me conta de que tinha jogado o meu futuro no lixo. O meu lado português tinha se manifestado no final da resolução daquela prova. No enunciado da redação havia uma frase, muito clara, por sinal, informando que o texto não poderia, de forma alguma, ultrapassar trinta linhas. Trinta linhas? Só isso? Impossível! Eu não tinha escrito apenas trinta linhas. De forma alguma. Eu não sou, exatamente, a pessoa mais sucinta, como devem perceber pelos meus textos do Blog. Que loucura...eu nem conseguia raciocinar direito. O que faria? Não teria mais tempo...the game was over. A única coisa que deu tempo de fazer antes de entregar a prova foi contar quantas linhas a minha redação tinha. Oitenta e nove linhas, nenhuma a mais e nenhuma a menos...oitenta e nove. Eram três redações em uma só. Eu tinha dançado!!! Foi muito triste para mim, demais de triste, mas foi mais um aprendizado. Eu até quis bater as minhas respostas com o gabarito...e fiz isso. Tive forças para fazer isso. De fato, tinha ido muito bem...teria entrado naquela faculdade não fosse a minha displicência. Mas tive que seguir a vida, convivendo com aquela lembrança desagradável. Aliás, convivo com ela até hoje. E o engraçado é que, mesmo tendo passado por isso, por mais que me esforce para não ser, por mais feedback que tenha recebido ao longo da vida, continuo sendo uma escritora prolixa...acho até que é por convicção. A minha alegria agora é que posso escrever quantas linhas quiser nesse Blog, pois o faço para mim mesma. Não estou prestando nenhum vestibular. Sei que tem gente que não gosta de ler o que escrevo, que acha chato chegar até o final das minhas crônicas, mas isso não me incomoda, pois, sobretudo, eu as escrevo porque me divirto muito pensando em todas essas histórias da minha vida antes de colocá-las no site. Com relação à questão da descendência portuguesa, nada contra os portugueses, viu? É só brincadeira. Mas para não chatear os portugueses que venham a ler essa história, faço aqui, no final do texto, uma homenagem a vocês, tugas. Como falar mal dos portugueses se entre eles há um ilustre literato, filho de analfabetos, técnico em mecânica automotiva, que estudou sozinho e foi considerado o responsável pelo efetivo reconhecimento internacional da prosa na língua portuguesa? Não posso, né? José Saramago, o serralheiro mecânico, português, que virou poeta. E olha que ele nasceu em Azinhaga, hein? Não foi nem em Lisboa!!! Aliás, agora, para, realmente, finalizar, preciso contar que entre os feedbacks que recebo sobre as minhas crônicas há um que me compara ao Saramago...de forma negativa. Antes de morrer, aos 87 anos, ele escrevia páginas e páginas sem uma vírgula. Segundo o meu irmão, o dono do feedback, tenho um pouco do seu estilo, pois não faço parágrafos em meus textos. A diferença é que, pelo menos, as vírgulas procuro colocar em seus devidos lugares. Mas um dia chego lá...vou tentar me desapegar delas também. Dos parágrafos já não sinto mais falta.

Comentários

  1. Prolixa, eu? rsrsr Me identifico... Bjs.

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  2. Sem virgula não vai dar hein? Preciso parar pra respirar! Me divirto com seu blog kkkk

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